(A Vinícius Rodrigues)
O prazer contemplativo de observar o colapso das coisas...
O cinismo que rejeita os deuses e os homens...
O vazio a bradar verdades frias...
Tudo posto de lado,
Tudo adiado,
Tudo...cuspido.
Ah, humanos, carcaças rastejantes...
Todas as salvações aniquiladas,
Exceto a impraticável, exceto a que nos priva de nós mesmos...
Ó horas, ó pesar de ser, ó intermitente pulsar!
Languidez transcedental,
Repulsa por todo movimento,
Condenação a todo esforço...
Muito distante de tudo para se deixar enganar,
Muito penetrado em si para participar de qualquer coisa.
E à parte, à parte dos acontecimentos como um deus à parte da criação.
E é na madrugada do teu ser que indiferentemente reinas,
Quando nada te atinge ou pesa,
Quando o desinteresse torna-se absoluto,
Quando viver ou morrer não passa de uma questão de capricho.
O mundo sempre em ruínas
E tu (vejo-te) em êxtase como se contemplasses o apocalipse...
Ah, esses instantes em que se vê o mundo desmoronar!...
O paraíso consiste nos três segundos em que se fita a completa destruíção.
Sim, o prazer contemplativo de observar o colapso das coisas,
Estavas a falar disso.
(Era ainda um sorriso, ainda que brando.
Era, depois, um não ter o que dizer.
O silêncio se fazia presente como uma substância perene.)
Sono...
Estaremos a salvos enquanto pudermos sossegadamente dormir...
Lembro-me: o sol do fim do dia dando à cozinha tonalidades alaranjadas.
Mas já é noite, e é noite de um dia que não aquele.
Aquele dia se passou como esse, como se tem passado a minha vida inteira.
Mas já é noite, e hei de dormir,
Findo esta sonolenta vigília e estes sonolentos versos tardios.
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